A oposição venezuelana saiu às ruas, demonstrando um fio de esperança, mas era provável que, no fundo, os democratas soubessem que estavam lutando uma batalha perdida. Apesar de todas as pesquisas, inclusive as de boca de urna, que apontavam Edmundo González Urrutia como líder, o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela declarou Nicolás Maduro vencedor, com pouco mais de 50% dos votos. O uso do condicional é crucial aqui, já que qualquer processo eleitoral na Venezuela se tornou uma “burocracia cara”, como definiu o porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov, sobre um pleito em seu país vencido pelo também ditador e aliado de Maduro, Vladimir Putin.
A fraude na contagem dos votos é o desfecho lógico de um processo viciado desde o início. María Corina Machado, principal figura da oposição democrática e vencedora incontestável das primárias, foi arbitrariamente impedida de concorrer, e a primeira substituta escolhida para seu lugar também não conseguiu registrar sua candidatura.
O chavismo reprimiu duramente a campanha oposicionista, chegando a perseguir estabelecimentos comerciais que atendessem a González, María Corina ou outros opositores. A imprensa independente foi censurada, e a maioria esmagadora dos venezuelanos no exterior não conseguiu se registrar para votar.
Maduro ameaçou seus compatriotas com “guerra civil” e “banho de sangue” caso perdesse. No dia da votação, houve intimidação nos locais de votação e compra descarada de votos em troca de alimentos e gasolina.
Após o fechamento das urnas, a autoridade eleitoral venezuelana, totalmente controlada pelo chavismo, negou acesso e informações aos representantes da oposição. Todo esse cenário não se alinha, nem de perto, à ideia de “eleições livres e limpas”.
Dada a proximidade ideológica entre os dois esquerdistas, é quase certo que o silêncio de Lula sobre a “eleição” venezuelana pode ser interpretado como uma forma de consentimento tácito.
Os venezuelanos, no entanto, se encontram em uma situação desesperadora. Privados do direito de decidir quem deve governá-los, eles, sendo pobres e desarmados, não têm meios para reagir ou expressar sua indignação nas ruas sem enfrentar uma repressão extremamente violenta por parte do chavismo, que controla as Forças Armadas e os “coletivos” paramilitares.
A oposição política também está em uma posição precária, com poucas alternativas desde o início. Mesmo quando ficou claro que Maduro não respeitaria os Acordos de Barbados, boicotar a farsa eleitoral significaria entregar a vitória ao ditador, que poderia alegar que seus adversários evitaram desafiá-lo nas urnas.
Participar da disputa, apesar das evidências de um processo manipulado, poderia arriscar a legitimidade do processo. A única esperança restante para os venezuelanos seria um firme rechaço da comunidade internacional.
As mensagens de felicitações dos colegas ditadores e autocratas, assim como de outros parceiros ideológicos, eram esperadas. Miguel Díaz-Canel, de Cuba; Vladimir Putin, da Rússia; Xiomara Castro, de Honduras; Luís Arce, da Bolívia; e Xi Jinping, da China, expressaram sua satisfação pela “vitória eleitoral” de Nicolás Maduro.
Por outro lado, Estados Unidos e União Europeia adotaram uma postura de cautela e desconfiança. Anthony Blinken, secretário de Estado dos EUA, manifestou “sérias preocupações de que os resultados anunciados não reflitam a vontade dos votos ou do povo venezuelano”. A maioria das nações sul-americanas, mais familiarizadas com os métodos de Maduro, denunciaram a fraude, recusaram o reconhecimento dos resultados até o momento e pediram uma revisão dos mesmos. Até Gabriel Boric, do Chile, de orientação esquerdista, declarou que “o regime de Maduro deve compreender que os resultados que publica são difíceis de acreditar” e que “no Chile não reconheceremos nenhum resultado que não seja verificável”.
É o Brasil que Nicolás Maduro realmente deseja ver como fiador de sua legitimidade, e foi conveniente para o ditador que o país tenha desistido de enviar observadores eleitorais após um desentendimento entre Maduro e o Tribunal Superior Eleitoral. No final, os únicos brasileiros presentes na Venezuela foram políticos simpáticos ao regime.
Movimentos sociais de esquerda, aliados do petismo, já parabenizaram o ditador venezuelano, como o MST, a Juventude do PT e os chamados “juristas pela democracia”. O chanceler brasileiro de facto, Celso Amorim, sugeriu no domingo, com a votação ainda em andamento, que esperava “que [os resultados finais] sejam respeitados por todos os candidatos”.
O presidente Lula, que recebeu Maduro com tapete vermelho em Brasília e já declarou que “o conceito de democracia é relativo”, permanece em silêncio. Dada a proximidade entre os dois esquerdistas, é quase certo que o silêncio de Lula pode ser interpretado como um consentimento tácito, um silêncio que envergonha e diminui o Brasil diante do mundo democrático.
Da redação Ponto Notícias