Entre julho e agosto de 2024, uma operação coordenada retirou 593 indivíduos de situações de trabalho forçado, marcando um aumento de 11,65% em relação ao ano anterior, quando 532 pessoas foram resgatadas. A operação envolveu 23 equipes de fiscalização e realizou 130 inspeções em 15 estados e no Distrito Federal. Essa ação foi organizada por seis instituições: Defensoria Pública da União, Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal.
Os estados com o maior número de resgates foram Minas Gerais, com 291 pessoas, seguido por São Paulo com 143, Pernambuco com 91 e o Distrito Federal com 29. Os resgates ocorreram em 10 estados, com a maioria dos resgatados trabalhando na agropecuária (72%), seguido pela indústria (17%) e comércio e serviços (11%).
Entre as atividades rurais com maior incidência de vítimas estão o cultivo de cebola (141), horticultura (82), café (76), alho (59) e a combinação de cultivo de batata e cebola (84). Nas áreas urbanas, os principais setores com resgates foram a produção de álcool (38), administração de obras (24) e serviços de psicologia e psicanálise (18). Foram realizadas inspeções em dez residências, resultando no resgate de duas trabalhadoras.
Durante a operação, foram identificadas 18 crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, com 16 delas também submetidas a condições de trabalho análogo à escravidão. As fiscalizações foram realizadas em Amapá, Distrito Federal, Mato Grosso e Minas Gerais.
O coordenador Geral de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Análogo ao de Escravo e Tráfico de Pessoas, André Roston, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), apresentou um balanço das fiscalizações de agosto de 2024, informando que os trabalhadores já receberam cerca de R$ 1,91 milhão em verbas rescisórias, com uma estimativa total de R$ 3,46 milhões. O valor final deve ser superior, já que muitos pagamentos ainda estão sendo negociados ou aguardam decisão judicial.
Leonardo Magalhães, defensor público-geral federal da Defensoria Pública da União (DPU), destacou a significativa contribuição dos defensores públicos federais na Operação Resgate IV. Ele mencionou o resgate de 82 vítimas em Itapeva (SP), incluindo 48 mulheres e 34 homens, e a participação contínua da DPU desde 2014. Magalhães salientou as condições precárias encontradas, como a falta de água potável, alimentação adequada e moradias apropriadas. A DPU está envolvida no pagamento de verbas trabalhistas, negociação de danos morais, regularização de documentos e busca por benefícios assistenciais e previdenciários.
O subprocurador-geral do Trabalho Fábio Leal, do Ministério Público do Trabalho (MPT), destacou que a Operação Resgate IV é um marco significativo no esforço conjunto para erradicar o trabalho em condições semelhantes à escravidão. O MPT tem desempenhado um papel crucial na proteção dos direitos dos trabalhadores resgatados, tanto em termos coletivos quanto individuais.
O subprocurador-geral da República Francisco de Assis Vieira Sanseverino, do Ministério Público Federal (MPF), afirmou que a atuação do MPF visa coletar provas diretamente nos locais de trabalho para acelerar as investigações e tornar a apuração criminal mais eficaz.
Alberto Raposo, diretor-geral substituto da Polícia Rodoviária Federal (PRF), ressaltou a importância das operações integradas entre diferentes instituições. Em 2022, a PRF contribuiu para o resgate de 700 pessoas em condições de trabalho análogo à escravidão, número que aumentou para 1.300 em 2023. Raposo expressou o desejo de que, um dia, essas operações não sejam mais necessárias, quando a exploração laboral for totalmente erradicada.
O chefe de Divisão de Repressão ao Trabalho Forçado da Polícia Federal, Henrique Oliveira Santos, informou que a instituição está conduzindo 482 investigações em todo o país sobre o trabalho forçado. Minas Gerais é o estado com o maior número de inquéritos, totalizando 86, seguido por São Paulo com 66 e Pará com 47. Em agosto de 2024, a Operação Resgate IV resultou na abertura de 33 novas investigações, e ao longo do ano foram realizados 12 procedimentos que resultaram em 16 prisões em flagrante.
Entre os casos destacados deste ano, um exemplo notável foi a operação em Mato Grosso do Sul, onde a equipe de fiscalização utilizou diferentes meios de transporte, como caminhonetes, helicópteros e lanchas, para alcançar áreas remotas. Essa ação resultou no resgate de 13 trabalhadores paraguaios que estavam envolvidos em atividades de carvoejamento e construção de cercas, encontrados em condições degradantes e de servidão por dívida.
Outro caso significativo ocorreu em Pernambuco, onde 18 trabalhadores foram retirados de uma clínica para dependentes químicos. Esses trabalhadores, que eram pacientes da clínica, eram forçados a realizar atividades laborais como parte de seu tratamento, sem que a clínica registrasse empregados. A fiscalização nesse caso ainda está em andamento.
Em Minas Gerais, foram encontrados 59 trabalhadores em condições análogas à escravidão, incluindo sete mulheres e quatro menores de idade. Estes trabalhadores, a maioria migrantes do Maranhão, estavam empregados como colhedores de alho em propriedades rurais, e estavam expostos a condições de trabalho e de vida extremamente degradantes.
Resgate de Idosos e Situações Específicas
Em Mato Grosso, um resgate notável foi realizado com a retirada de uma mulher de 94 anos, a mais idosa a ser resgatada no Brasil. Ela trabalhou por 64 anos sem remuneração e sem experiências de vida típicas, como educação ou formação de família. Durante a ação fiscal, ela estava responsável pelo cuidado de uma senhora de 90 anos com Alzheimer. Como resultado do resgate, a trabalhadora recebeu garantias para usufruir da residência onde vivia, com todas as despesas cobertas pela família da empregadora, incluindo a contratação de um cuidador e um salário mínimo mensal.
Em São Paulo, uma empregada doméstica de 52 anos foi resgatada após ter sido retirada de um orfanato aos 11 anos e trabalhando compulsoriamente na casa dos exploradores desde então. Ela relatou longas jornadas de trabalho e ausência de períodos de descanso, com um pagamento mensal simbólico. Na época da inspeção, ela estava cuidando de um casal idoso. A família se comprometeu a adquirir uma casa para ela e pagar uma indenização de R$ 50 mil por danos morais.
No Rio de Janeiro, uma mulher de 59 anos foi resgatada após ter trabalhado desde os 13 anos para a mesma família, sem remuneração e com isolamento social. O número de denúncias de trabalho escravo doméstico tem aumentado desde o primeiro resgate em 2017, com a complexidade das situações exigindo ações cuidadosas e detalhadas.
Estrangeiros e Atuação da DPU
Em agosto, em Anta Gorda (RS), quatro trabalhadores argentinos foram encontrados em condições precárias enquanto extraíam lenha. Eles estavam sem documentação adequada e vivendo em condições precárias. Após o resgate, receberam as verbas rescisórias e retornaram à Argentina.
A Defensoria Pública da União (DPU) desempenha um papel crucial, com treze defensores federais envolvidos na operação. A DPU oferece assistência jurídica e orientações sobre direitos trabalhistas e previdenciários, colaborando com o Grupo Especializado de Assistência a Trabalhadores/as Resgatados/as de Situação de Escravidão (Getrae). O grupo também gerencia denúncias e atua no suporte pós-resgate, como na emissão de documentos e acesso a serviços sociais essenciais.
Operação Resgate IV
A Operação Resgate IV é a maior ação conjunta do Brasil para combater o trabalho análogo ao de escravo e o tráfico de pessoas, envolvendo várias instituições como MTE, MPT, MPF, DPU, PF e PRF. A operação ocorre em agosto, coincidindo com o Dia Internacional para a Memória do Tráfico de Escravos e sua Abolição e o aniversário de falecimento do abolicionista Luís Gama.
Da redação Ponto Notícias
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